Expurgos
Purificar, do latim purificare, significa tornar puro, limpar, purgar, santificar. Parece algo bonito, agradável de se fazer e ver. Pelo menos era isso que eu imaginava até ontem.
Durante quase toda a viagem de ônibus para Porto Alegre me senti desconfortável, e quando passávamos por Canoas, vomitei. Saí correndo do meu lugar em direção ao banheiro e pus toda a minha janta para fora. Nojento, concordo, tanto de ver quanto de fazer.
Levei 15 minutos limpando minha cara, minha roupa e assoando o nariz, para que não levasse comigo aquela sujeira toda. Quando terminei, voltei para minha cadeira, e senti um bem-estar impressionante. Eu havia me purificado.
Sempre imaginei que para purificar-se era necessário tomar um banho de cachoeira ou passar sal grosso no corpo. Mas isso é poético demais, limpo demais. Purificar-se é como vomitar: é sujo, fedorento, desagradável. Todos os seus sentidos são tocados pela imundície, e o que é pior: pela sua própria imundície. Ter que olhar para aquilo que estava sendo digerido dentro do meu estômago foi a parte mais aversiva de todo o processo, pois foi como ver minha própria podridão.
O ato de vomitar é apenas uma purificação vulgar, simples, pois é só ir no banheiro e pôr o dedo na garganta. Purificações espirituais são muito mais sutis e complicadas, e você é obrigado a ver não a última coisa que você comeu e digeriu parcialmente, mas o próprio mal que existe em sua alma. Com certeza, acredito que ninguém gosta de ver isso, pois imaginamo-nos perfeitos e bondosos por inteiro. Mas acontece que não somos, e tentamos a todo o custo reprimir este nosso lado, o que o torna ainda mais forte.
Quando encaramos o nosso próprio Lado Negro, aceitamos o fato de que ele é uma parte de nós mesmos, e assim, o corrigimos, pelo menos um pouco. Ficamos puros. E isso é bom.